Fugindo do tom laudatório típico da marioria dos livros do gênero, Marília de Camargo Cesar retrata em "Marina: A Vida por uma Causa", biografia da presidenciável Marina Silva, um outro Brasil.
Vladimir Neri
Marina Silva é uma pessoa iluminada. Dona de uma das trajetórias políticas mais extrordinárias e fascinantes que nosso país já pôde acompanhar, a senadora Marina oferece à jornalistas e biógrafos profissionais um "campo de trabalho" vasto e promissor. Marília de Camargo Cesar soube bem explorar esta imensa lavoura, próspera em tons dramáticos em seu "Marina: A Vida por uma Causa" (Ed. Mundo Cristão). Mas, ao contrário de certos aventureiros que, desejosos de grande auto-promoção midiática (e boas vendas de suas criações), servindo-se dos perfis pessoais, acabam por promover beatificações descaradas de seus biografados, Marília de Camargo Cesar mantém o equilíbrio e não cede aos sentimentalismos fáceis, nem a tentação de compor um elogio cego da parlamentar acreana.
A história de Marina emociona. Mas talvez mais emocionante que vislumbrar sua disciplina, sua expressiva auto-determinação, seu apetite por vencer e sua suposta predestinação divina, seja travar contato com o "país" onde Marina Silva nasceu, sobreviveu, cresceu e se fez conhecida; um país cuja extensão territorial não se limita à Av. Paulista ou à Copacabana, ao Projac ou ao Planalto. O Brasil de Marina é um território que, a despeito do profundo descaso do centro, tem vida própria, seguindo um ritmo próprio permeado por privações, problemas estruturais gravíssimos, injustiças medievais, mas também por mobilizações íntimas e coletivas, insubordinação existencial, muito trabalho e sobretudo, muita atitude. Camargo Cesar, num estilo ágil próprio do jornalista que imerso em determinada realidade, tem à inteira disposição todos os recursos necessários para contar o que viu, leu, conversou e respirou, enxerga em Marina esta paisagem inquieta composta por seringueiros constantemente ameaçados pela voracidade dos interesses dos coronéis, mas que, vencendo todos os prognósticos e sombrias perspectivas, permanecem fortes e avançam, buscando no mútuo apoio e na auto-conscientização a fonte de energia indispensável para persistir.
Em "Marina", aprende-se também que a história dos brasileliros não começou com Collor de Mello, com a conquista do Tetra ou com o surgimento do Plano Real. Há muito tempo atrás Chico Mendes e seus companheiros (ente eles, Marina), lutavam pelo fim do opróbrio na extrema Amazônia e incendiavam o imaginário local com suas propostas de defesa da floresta e pão para todos; tudo isso em pleno hiato ditatorial e tendo, somente, a ajuda de alguns poucos homens e mulheres ligados à Igreja Católica brasileira.
Este Brasil instigante, mostrado com competência por Marília de Camargo Cesar, pode, um dia, se fazer ainda mais presente no outro Brasil - o Brasil abaixo do Equador - e quem sabe, mudar verdadeiramente para melhor, a realidade desta imensa república ainda cheia de florestas e de gente dizendo adeus.
Marina: A Vida por uma Causa
Marília Cesar de Camargo
Ed. Mundo Cristão
Nenhum comentário:
Postar um comentário