quarta-feira, 27 de junho de 2007

Terra Papagalli

por Gladston Mamede

A cada dia que passa, os discursos que se ouvem no Senado Federal assustam mais. A falta de pudor no uso dos argumentos é tanta que, se submetidos a uma comissão de homens ilibados, um conselho de anciãos que traduzissem o “vox populi”, só pela defesa de determinadas teses muitos deveriam ser censurados por falta de decoro.

Uma dessas teses esdrúxulas é a de que, se a gravidade da acusação for excessiva, o Conselho de Ética perde a competência para julgar o decoro, devendo a matéria ser examinada pelo Supremo Tribunal Federal. Vale dizer, lançou-se no lixo a percepção lógica do mínimo ético. Ora, ora, ora. O crime mais hediondo, com a pena mais elevada, é um ato que desrespeita a ética, é um ato que falta com o decoro. Portanto, o fato de determinada conduta ser definida como criminosa não afasta a competência para que o Conselho de Ética examine-lhe o decoro: não condenará pelo crime, mas poderá, sim, aplicar as sanções disciplinares correspondentes, ainda que a perda do mandato.

Trata-se, aliás, de matéria pacífica na jurisprudência brasileira. Mas, não. Aqueles que ocupam a condição de senadores, mesmo não mostrando envergadura para tanto, pouco se preocupam com a República e com o efeito moral de suas declarações descabidas. Pior: sua defesa não-razoável e absurda deixam tão claro o esforço da impunidade que o Estado em si é desmoralizado. Assim, o miserável de chinelas e arma automática, em qualquer dos morros afavelados do país, ganha a condição de revolucionário, de resistente: ganha legitimidade. Não é menos criminoso do que os que se exercem funções de Estado.

Vai-se, assim, a autoridade, vai-se a legitimidade, vai-se a segurança jurídica. Balas perdidas, num contexto deste, é algo bem simples.

(in www.pandectas.com.br)

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